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Evandro Prado // Felipe Oliveira Mello // Fernando Ribeiro // Flávia Metzler // Rafo de Castro //  Yara Dewachter

Dá Licença

Texto Crítico: Vanda Klabin

DÁ LICENÇA! #1 inaugura o calendário anual de 2018 da Tramas Arte Contemporânea e conjuga obras que fazem parte do acervo da galeria e outros artistas convidados. A mostra focaliza um conjunto de trabalhos contemporâneos que apresentam associações, afinidades e oposições entre as mais diversas formas, técnicas e linguagens. As obras aqui expostas têm algo em comum, sublinhadas pelas afinidades ou diferenças, seja quanto às técnicas que usam, seja quanto à maneira de manipular a linguagem imagética fortemente figurativa ou pela utilização de uma iconografia onde o banal e o cotidiano se evidenciam e adquirem uma intensidade plástica.

 

Aqui encontramos alguns dispositivos narrativos que transpiram uma linguagem visual pop, com uma temática extraída da cultura popular contemporânea. Utilizam imagens instantaneamente familiares e reconhecíveis na vida cotidiana, que estão presentes nos produtos de consumo, no universo das histórias em quadrinhos, nos cartazes publicitários ou no diálogo com a história da arte. São diferentes intervenções estéticas que evidenciam diversas dicções, instigantes em suas tramas e contrapontos visuais.

 

A exposição explora as relações complementares da estética pop – aqui revestidas de outros matizes e sutilezas – onde prepondera uma estrutura lógica do pensamento dado e no surrealismo, ao confundir as expectativas, cria uma narrativa de algo estranho combinado com o familiar, a evocação de um mundo paralelo que parece colocar em dúvida os limites entre o real e o ficcional.

 

Nessa conjunção de arte e ironia, o inesperado é necessário. Desfazer a ordem, criar a situação de ambiguidades, é uma condição para uma nova leitura da imagem. A arte atua como um poder transformador, no sentido de desarrumar o arrumado, dado que o artista ao se apropriar de imagens ou objetos que são removidos de sua natureza cotidiana e ampliar seus sentidos pela junção de elementos díspares ou pela repetição compulsiva, cria uma multiplicidade de possibilidades e redireciona a atenção do observador para novos significados.

 

Evandro Prado Utiliza imagens recorrentes que se substanciam em temas e contextos religiosos como símbolos do consumismo e institui uma sensibilidade muito próxima ao universo pop. No romance – colagem do filme de Max Ernst, A Mulher de 100 Cabeças, de 1929 – as imagens repetitivas são reunidas com o objetivo de criar um mal-estar psíquico e inverter seus sentidos. A repetição dos mesmos elementos torna-se um instrumento eficaz para colocar em discussão a ordem vigente e uma tendência à transgressão. Nesses trabalhos, Evandro transpõe para uma nova composição, uma imagem amplamente conhecida do Papa Francisco, que conserva algo de sua identidade original com seus ornamentos e símbolos do papado. Através de uma repetição compulsiva, ressignifica as imagens sacras e objetos de devoção, agora ativadas em um outro sistema de imagens. Evoca um mundo paralelo, atualiza um ícone publicitário preso a cânones religiosos ou a uma iconografia sagrada, reproduzido pela subtração dos aspectos qualitativos e ostentatórios.

 

Flavia Metzler Cria um repertório de imagens através de relações simbióticas ou psíquicas, que encontram ressonâncias nos impulsos inconscientes presentes das práticas surrealistas. Uma espécie de algo secreto, escondido que veio à tona, convulsiona um espaço desconcertante que atua como um fragmento de um sonho ou de uma narrativa. Seu trabalho pictórico visa problematizar o olhar, evocar o estranho com cenas quase metafísicas em seus devaneios inconscientes. Distanciados do mundo real, presenciamos um sentido de mistério e alucinação, verdadeiras construções da realidade.

 

Fernando Ribeiro Provoca o nosso olhar com releituras críticas e irônicas ao reagenciar e adaptar obras do repertório clássico da historiografia da arte.

Pela apropriação de imagens do universo pop, através de pequenas e sutis intervenções, seus signos estéticos atuam como um campo de manobra, ao fazer alusão aos trabalhos de artistas reconhecidos no mundo da arte. São uma espécie de desejos breves, bem-humorados, inserções desconcertantes que arrebatam algo real e dele se apropria, adquirem uma intensidade inesperada e provocante. São imagens inspiradas nas pin-ups despersonalizadas encontradas em revistas da sociedade de consumo e reduzidas ao estado de sex- symbols e que agora trazem a inclusão de orelhas de Mickey nos mamilos evidenciados ou nos feltros tão utilizados nas obras do artista alemão Joseph Beuys.

 

Felipe Mello Oliveira Utiliza amplamente uma iconografia específica e instantaneamente reconhecidas, vinculadas ao endeusamento de figuras mediáticas, um mecanismo de star systems, que são verdadeiros objetos de fascínio extraídos das revistas e jornais sensacionalistas ou vetores publicitários. Consolida seu trabalho com imagens retiradas da família real britânica, com rostos bloqueados e sobrecarregadas por lacres de intensos vermelhos e através de linhas de costura com fios dourados, como um mecanismo interno de criar uma situação de estranhamento, uma observação o mais distanciada do mundo real e conferir à imagem, um processo de composição ficcional aliada a um desejo de confundir as expectativas convencionais.

 

Rafo Castro Sua experimentação artística parece dissolver o sistema figurativo e redefinir as formas anatômicas para produzir uma nova geração de imagens, uma matéria pulsante, quase uma célula física que já imprimiu os seus vestígios na memória pública urbana. Corpos biomórficos em seu silencioso anonimato, muito vibrantes e ousadamente delineadas, estão materializados em tábuas de corte, subtraídas de sua utilização natural, que parecem colidir com o espaço composicional e criar uma fusão intrigante. Evoca o estranho, com olhos cáusticos para o subterrâneo, sempre à margem e expressam um outro tipo de lógica, germinações alusivas ao enigmático inconsciente, tocadas por um sopro surrealista. São sugestões de massas amorfas, desconstruídas e reconstruídas, que se avolumam través de tensões dinâmicas, distorcidas a ponto de se tornarem difíceis à leitura, pintados em cores brilhantes e circuladas por fortes contornos negros, absurdas em sua corporeidade e inflamadas pela ironia.

 

Yara Dewachter Trabalha diretamente com objetos já existentes e confia todo o impacto do seu museu ficcional ao contexto dos objetos icônicos que povoam o imaginário infantil com o recurso de torná-los seres submersos. Introduz os seus elementos de representação em conjunto para uma plena convivência ao desconfigurar personagens da Disney, heróis, bonecos e imagens da cultura consumista popular infantil ou gnomos brotados de alguma fábula. Toda essa iconografia comercial, produzidas em suas pequenas dimensões e emergentes dos suporte, são colocadas em suportes quase glaciais de parafinas e cristalizados nas vitrines de grandes armários. Esses objetos de fascínio, embora aprisionadas em vitrines, se transformam em perturbadores personagens que trazem uma força, uma intensidade, uma fermentação criativa e uma improvável irônica rede de interlocução gravita fortemente em torno desses ícones visuais pop.

 

Vanda Klabin

Curadora

 

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